sábado, 30 de novembro de 2013

Fornos Maceira Dão. Afloramento na Serra dos Cabaços e a sua ligaçao com os Celtas

Gruta da Moura - limite do antigo caminho pedonal de Fornos para Mangualde

Também chamado o Penedo do Pecado. O Penedo dos Cabaços. Penedo dos Casamentos. O esconderijo das bruxas que dançavam numa laje ali ao lado.
 
As palavras chave: Pecado, cabaços, bruxas, casamentos, danças, e esconderijo.
 
Porquê pecado? questiono.  




 
 
O afloramento está associado a rituais e cultos célticos.
Como sabemos, os Celtas eram uma “nação” politeísta. Realça-se que em todo o mundo celta, havia comunidades que tinham os seus próprios deuses, para além dos deuses comuns.
Nos rituais religiosos dos celtas, realizados em locais ao ar livre, onde a natureza seria “a mãe de toda a existência” haveria participações de homens e mulheres integralmente nus, mas nada de cariz sexual. Daí, talvez, o afloramento ser apelidado, o penedo do pecado. Sabemos que o cristianismo não aceitava tais posturas e rituais, e também por isso denominarem o penedo das feiticeiras, seria pela participação de mulheres nas danças cerimoniais, ou seriam os sacerdotes que nas cerimónias usavam os seus capotes brancos, fazendo lembrar as feiticeiras? Como referia, o catolicismo “in illo tempore” não aceitava, sendo consideradas pagãs.
Notável, também, a condição social das mulheres, de igualdade em relação aos homens, e por vezes, uma comunidade mais matriarcal que patriarcal.
O que é certo é existir uma simbiose perfeita entre os celtas e a natureza ao ponto de considerarem vários deuses a alguns símbolos naturais como as rochas e as arvores...
Existiu, naquela época, um importante povoado, aldeia ou cidade celta, aqui bem perto, na encosta nascente da Serra dos Cabaços, denominada “Castelo Araócelo”. Com a propagação do Cristianismo e romanização, alterou para o topónimo que ainda hoje possui, São Cosmado. Existiriam outras localidades envolventes e que se encontrassem naquele lugar para tais rituais? É provável.
Grande parte do legado celta foi “apagado” pelo catolicismo de então, e por outras causas, e sabe-se muito pouco, já que, apesar de muito cultos, não foram escritos os seus conhecimentos à semelhança de outros povos dessa época, como por exemplo os romanos. Aceito que mais registos tenham elaborado os romanos sobre os celtas, que os próprios celtas de si mesmos.
 Ainda assim, várias tradições mantiveram-se até ao século XX, e em diferentes países.
Participei, alguns anos, em manifestações culturais, presumo a sua origem céltica.
Em algumas ocasiões, fomos perseguidos pela Guarda Nacional Republica. Nunca soubemos quem decidiu tais buscas, mas a tradição ía sendo conservada ano após ano, apesar das perseguições e riscos – o lançar dos cabaços ou casamentos.
Relembro um facto sucedido: O Senhor Angelino Baptista, Pai dos meus respeitosos amigos, Rui Baptista, Mário Baptista e José Alberto Baptista, que participou, no seu tempo, nesses eventos. Após a Guarda Nacional Republicana os ter neutralizado nos seus actos, um agente conseguiu agarrar no funil do Sr Angelino, no breu daquela noite de inverno ou de primavera fria, antes da quaresma. Com receio de chegar a casa sem o funil que enchia os túneis de vinho do seu pai, gritou: …se regressar a casa sem o funil que nem sequer o pedi ao meu pai, ele mata-me… estica com tanta força o braço, e eis que fica o elemento da Guarda Nacional Republicana com a parte larga do funil, e o senhor Angelino com a parte estreita na sua mão, e escapa-se do Guarda, mas que de pouco lhe valeu, pois teve de carregar com os açoites de seu pai.
Em que assentavam os Cabaços ou Casamentos:
Elaboravam-se duas listas de pessoas solteiras, independentemente da sua idade. Um rol de homens e um rol de mulheres. Eram ponderadas/os todas/os que tivessem já atingido a puberdade, a olhos vistos, exprimamo-nos assim. Por vezes, seria omisso um ou outro caso dúbio, consoante existisse número suficiente para formar parelha. Cada nome era escrito num pequeno papel, dobrado e colocado numa boina – quer para mulheres, quer para homens. Daí sairia, por sorteio, a parelha correspondente. Naturalmente, eram criadas excepções, aos casos de alguma intenção expressa ou a pura existência de qualquer caso suspeito de feição amorosa, bom tema de “cochicho” na época, de vontade própria, ou mesmo de remédio inevitável, como era o caso dos solteirões ou solteironas. Muitas das vezes com motivo de tentar arranjar/arrumar uma relação que tardava. Julgo fazer-me entender.
O sorteio e o lançamento dos cabaços ou casamentos, era anunciado numa noite, antes da quaresma. Uma vez mais, a força do catolicismo a ditar a altura do disseminar dos casamentos. Os participantes, apenas solteiros, e com liberdade para poderem anunciar, muniam-se de grandes funis. Pela idade, ou outras razoes, nem todos eram autorizados pelos pais, a participar. Um grupo localizava-se no caminho que leva a Serra se Santo António dos Cabaços, junto do chamado Sanatório, e outro na colina dos Outeiros junto dos Barreiros, na então chamada Vinha do Caetano, outro ponto alto e frontal ao primeiro.
Na aldeia, as raparigas, caso desejassem, tentavam ouvir, para identificarem o seu par elegido.
Sabendo bem o entoação, e em breve farei um cadastro fonético, relembro as expressões e forma do lançamento dos Cabaços ou Casamentos.
Em uníssono, consoante a intervenção de cada grupo, e que normalmente era composto por entre quinze a vinte elementos, por vezes mais:
O grupo 1 (dos solteiros) iniciava o ritual, e que aqui represento a negrito não sublinhado, sendo o grupo 2 – relativo as solteiras que abaixo represento em sublinhado, assim sendo:
stá lá com-pa-dre… (b)… stá lá.
stá lá com-pa-dre... (b)… stá lá.
Va-mos i-ni-ci-ar… (a)… Va-mos i-ni-ci-ar…(c)… os ca-sa-men-tos dois mil e quin-ze com-pa-dre…(b)… os ca-sa-men-tos dois mil e quin-ze.
stá bem com-pa-dre…(b) … stá bem.
Pri-mei-ro ca-sa-men-to… (a)… Pri-mei-ro ca-sa-men-to…(c)… José Manuel Amaral … (b)… com-pa-dre… (c)… José Manuel Amaral.
stá bem com-pa-dre…(b) … stá bem. (pausa de sensivelmente 3 a 4 segundos) e retomava o mesmo grupo).
Pra e-sse gen-til me-ni-no…(a) … Pra e-sse gen-til me-ni-no …(c) … Judite Peixoto Amaral… (b)… com-pa-dre…(c)… Judite Peixoto Amaral.
Bo-a ra-pa-ri-ga …(b) … com-pa-dre …(b) … Bo-a ra-pa-ri-ga. (pausa de sensivelmente 3 a 4 segundos) e retomava o mesmo grupo).
Se-gun-do ca-sa-men-to… (a)… Se-gun-do ca-sa-men-to…(c)… António Fernandes …… e assim por diante até se finalizarem todos os casamentos, nos termos aqui apresentados no primeiro casamento, que como é evidente, faziam parte integrante da lista.
Ajudas
Stá= está
…(a)… = Pausa de inspiração de ar para os pulmões.
…(b) … = pequeníssima pausa com ligeira baixa de tom.
…(c) … = pequeníssima pausa com ligeira subida de tom.
Finalizado o ritual, havia sempre comida e bebida, cada qual levava o que podia tirar em suas casas, e era então elaborada a lista dos casamentos efetuados, e colocada em porta de madeira de uma casa, num local central da aldeia para consulta de interessados.
 
 
 
 
 
 
 

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